O painel da corrupção institucionalizada, revelado com estratégica sabedoria pelo juiz Sérgio Moro, está promovendo mudanças naqueles que, encastelados em seus privilégios e altos salários, já estavam acostumados a considerar o sistema corrupto de loteamento dos tesouros da nação, como parte intrínseca da governabilidade democrática. Com a avalanche de denúncias e comprovações de roubos realizados sistematicamente aos cofres públicos, ocorre uma mudança na percepção dos cidadãos que observavam - indignados ou não - o butim ocorrer em todos os níveis dos poderes*.
O pedido de demissão do ministro Jorge Hage da CGU - Controladoria Geral da União, em 07.12.14, vem alertar sobre os critérios utilizados na escolha dos responsáveis pelos órgãos de controle do direcionamento e aplicação dos recursos autorizados legalmente pelos governantes.
Discursou o ministro na abertura do dia internacional anticorrupção:
"Destaque especial merece a situação das empresas estatais, sobretudo as de economia mista, por onde passa hoje a parcela mais vultosa dos investimentos federais. Estas situam-se praticamente fora do alcance do "sistema", a não ser pela via das auditorias anuais de contas, procedimento basicamente formal-burocrático, de baixa efetividade para fins de controle. Fora daí, tem-se apenas, da parte do órgão central, a possibilidade de auditorias por amostragem ou decorrentes de denúncias, o que é absolutamente insuficiente, na medida em que se alcançam somente alguns contratos, num universo onde estes se contam pelos milhares."
Absolutamente insuficiente. Demorou, não? Antes tarde do que muito mais tarde!
Além da fragilidade operacional no controle, denunciado pelo ministro demissionário - incluindo restrições na fiscalização das empresas estatais de economia mista, como a Petrobras - acrescenta-se agora a legalização de crimes contra a responsabilidade fiscal, através do PLN 36/2014 alterando a LDO e o decreto nº 8367/14, chantageando e remunerando parlamentares através de um mensalão grupal, no valor de R$ 444 milhões, liberáveis sob condições, atrelado às emendas pessoais dos parlamentares e, por tabela, seus partidos.
Com essa maracutaia explícita, e com a restrição de recursos ao CGU, o governo federal confirma a propaganda enganosa da campanha eleitoral e pós eleitoral, de que tem incentivado os órgãos de fiscalização e controladoria a não deixarem "pedra sobre pedra, doa a quem doer". Aos protestos dos agentes da Polícia e da Receita Federais, por serem tolhidos em suas investigações, o governo contrapôs melhoria$ e regalia$ à consciência cidadã dos delegados e chefias.
Após oito anos na chefia do CGU, o ministro Jorge Hage escolheu uma boa ocasião para sair denunciando o faz-de-conta, mantido sob medida pelo governo, nas instituições de fiscalização e controle dos gastos públicos. Quem sabe agora outros também adquiram coragem para desmascarar de vez o discurso contraditório da presidente e sua turma, que assume e pratica novo ditado: digo o que não faço e disfarço o que faço.
Quando apenas os valores e a rede de corrupção do escândalo na Petrobras, já é considerado o maior do mundo em países democráticos, pode-se imaginar o adjetivo que será usado quando as demais empresas estatais sofrerem investigações de fato.
É dever de casa de todos os cidadãos de bem acompanhar e cobrar correções institucionais, concretas e permanentes, aos governantes e parlamentares.
Publicado parcialmente no jornal A TARDE de 11.12.14, coluna Espaço do Leitor.
* Ontem, 18.12.14, após protestos da classe, o presidente do Ministério Público na Bahia, suspendeu o decreto que transferia seis procuradores que investigam desvios de dinheiro público. Vai analisar melhor a questão.
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