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segunda-feira, 23 de março de 2015

Por outro Judiciário

O que já era esperado há tempos pelos cidadão mais atentos foi proclamado pela ministra e atual vice-presidente do Supremo Tribunal Federal - STF, Cármen Lúcia, integrante da segunda Turma, que vai julgar os processos resultantes da Operação Lava Jato: 
"Não acredito numa reforma do Poder Judiciário. Acho que tem que ser (instituído um) outro Judiciário para (atender) a sociedade que a gente está vivendo. A sociedade quer e precisa de uma resposta rápida. Não somos justiceiros, somos juízes: ou condena ou absolve, mas precisa dar resposta".

A grata declaração foi dada pela ministra, após participar da inauguração da 2ª Vara da Violência Doméstica e Familiar de Salvador, onde fez um duro discurso condenando a violência contra a mulher e o forte preconceito da sociedade machista brasileira em relação ao gênero feminino.

Ela veio confirmar minhas convicções de que o sistema judicial brasileiro é talhado para manter impunes os corruptos poderosos, dentro da legalidade. Os tribunais chancelam e justificam legalmente os crimes praticados pelos grupos do poder. 

É argumento recorrente a frase dos advogados de defesa dos políticos, incluídos na lista de Rodrigo Janot: "Todas as doações recebidas foram declaradas e aprovadas pelo TSE".

Vale manter um pouco de memória e atenção para ver que inúmeras outra investigações que envolviam empreiteiras e apontavam para criminosos graúdos - ligados de alguma forma aos chefões da República corrupta-corruptora - foram barradas pelo Judiciário, quando não eram dissipadas pelos próprios interessados no Legislativo ou no Executivo.

A ex-ministra do Conselho Nacional da Justiça - CNJ, Eliana Calmon, apresentou em artigo de 19.11.2014, Nunca dantes neste espoliado país, relação de escândalos investigados e levados ao STF que resultaram em nada contra os criminosos. Vejamos:

"Para não parecer pessimista, basta lembrar dentre os maiores escândalos financeiros envolvendo altos figurões da República e desvios de recursos públicos, cujo destino já se sabia de antemão - iriam para as campanhas eleitorais e engordariam as contas pessoais dos candidatos e seus parceiros: 


- Anões do Orçamento (1989 a 1992, 800 milhões dentro do Congresso Nacional); 


- Vampiros (1990 a 2004, 2,4 bilhões, fraude a licitações dentro do Ministério da Saúde);

- TRT de São Paulo (1992 a 1999, 923 milhões, envolvendo o Senador Luiz Estevão e o Juiz conhecido como Lalau); -BANESTADO (1996 a 2000, 42 milhões, no Estado do Paraná);

- Banco Marka (1999, 1,8 bilhões, dentro do Banco Central;

- Pobre Amazônia (1998 e 1999, SUDAM, 214 milhões);

- Máfia dos Fiscais (1998 a 2008, 18 milhões, Câmara dos Vereadores de São Paulo);

- Mensalão (2005, 55 milhões, Câmara Federal, envolvendo o PT);

- Sanguessugas (2006, 140 milhões, envolvendo 3 senadores e 70 deputados);

- Operação Navalha (2007, 610 milhões, envolvendo o Ministério das Minas e Energia, nove Estados, o DF e a empresa Gautama).

Todos esse escândalos foram investigados pela Polícia Federal, monitorados pelo Ministério Público Federal e processados pela Justiça. Mas, houve punição adequada?"



Além desses, lembramos uma das primeiras tentativas de arrolar empreiteiras em investigações de corrupção, golpes financeiros, superfaturamento e outras que foram significativas para revelar um Judiciário compassivo com os maiorai$ endinheirados:

- Canal da Maternidade (1993) - Rio Branco/AC, que no rastro da CPI dos Anões do Orçamento, motivou proposta do senador Pedro Simon (PMDB-RS), para a criação da CPI das Empreiteiras. O governador do Acre, Edmundo Pinto de Almeida Neto (PDS), que iria depor dia 19 na CPI do Congresso, sobre a malversação de verbas para a construção do Canal da Maternidade com recursos do FGTS (Fundo de Garantia de Tempo de Serviço), obra super faturada realizada pela construtora Odebrecht, antecipou que ia contar tudo à CPI... Foi assassinado antes, na madrugada de domingo 17 de maio de 1992, no apartamento 704 do Hotel Della Volpe, à rua Frei Caneca, centro de São (Paulo. O ex-ministro do Trabalho do governo Collor, Antonio Rogério Magri (PT), também envolvido, estava convocado para depor.

- Operação Satiagraha (2004), surgiu no rastro da Operação Chacal, em que a PF investigava movimentações no mercado brasileiro de telecomunicações. O Grupo Opportunity era o controlador acionário da Brasil Telecom, mas a Telecom Itália estava interessada no posto. De acordo com a PF, Dantas e a então presidente da BrT, Carla Cico, contrataram a empresa de espionagem Kroll para bisbilhotar as atividades da companhia italiana no Brasil. Daniel Dantas sai-se livre das acusações da Operação Chacal. O que a defesa, feita pelo escritório do advogado Andrei Zenkner Schmidt, pretendeu com o HC foi contribuir ainda mais para sepultar a Chacal e apontar mais uma nulidade na origem da Satiagraha. Com a decisão, a diligência que apreendeu os computadores que permitiram à PF descobrir indícios de crimes financeiros na privatização da BrT (o objeto inicial da Satiagraha) foi declarada ilegal pelo STF, que se baseou no argumento de que o mandato de busca e apreensão era apenas para o escritório de Daniel Dantas e que a ampliação solicitada por telefone pelo delegado da PF e aceita pelo juiz de forma criteriosa - como vemos na cópia do mandado - foi feita de modo a induzir o juiz de que seria no mesmo endereço do mandado original.

- Operação Jaleco Branco (2007), R$ 600 milhões surrupiados em 10 anos, por fraudes nas licitações públicas na Bahia Processo relatado no Superior Tribunal de Justiça - STJ pela ministra Eliana Calmon, prendeu 16 pessoas, incluindo Antônio Honorato, o então presidente do Tribunal de Contas da Bahia - TCU, seu filho Adolfo Viana, deputado estadual (PSDB) e o empresario Marcelo Guimarães. Foi julgado após cinco anos de investigações, que se estenderam a outros Estados, protelações, embargos, chicanas e outras ferramentas jurídicas. Essa operação foi resultado do desmembramento da Operação Octopus, que gerou também a Operação Navalha.

- Operação Castelo de Areia (2009-2011), onde a PF investigou supostos crimes financeiros e Lavagem de dinheiro em operações do Grupo Camargo Corrêa. Inicialmente, o juiz Fausto De Sanctis havia afirmado que a investigação não envolvia parlamentares, porém Michel Temer (PMDB) aparece em uma lista da empreiteira e também Roberto Arruda, o secretário da Habitação de Gilberto Kassab(PSD), Elton Zacarias, o irmão de Antonio Palocci, Adhemar Palocci,... No dia 5 de abril de 2011 a operação chegou ao fim, anulada pela 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça. A ministra relatora do processo Maria Thereza de Assis Moura entendeu que o processo deveria ser anulado porque as provas contra os acusados foram obtidas de fontes anônimas, sendo seu voto acolhido à unanimidade; "A delação anônima serve para o início das investigações de forma que a autoridade policial busque provas, mas não serve para violação de qualquer direito fundamental do ser humano", afirmou o desembargador (convocado ao STJ) Celso Limongi, que participou do julgamento. Em 07 de abril de 2011, o Ministério Público recorreu da decisão ao Supremo Tribunal Federal - STF, que ainda não se pronunciou sobre o caso. 

"À época da investigação, todos os citados nos documentos apreendidos negaram qualquer prática ilícita. Procurado, o ministro Barroso não respondeu por qual motivo o recurso dormita há oito meses em sua gaveta. Muito embora possa acelerar os desdobramentos da Lava Jato, a revalidação das provas da Castelo de Areia não são imprescindíveis. Os caminhos apontados, em algum momento, aparecerão no horizonte da força-tarefa sediada no Paraná. Entretanto, uma nova análise sobre a validade das provas colhidas serviria como um ótimo argumento para aqueles que classificam o julgamento do chamado “mensalão” do PT como um divisor de águas e apostam em uma mudança de postura das Cortes superiores no País, mais severa com os chamados crimes de colarinho-branco. Ao sair do limbo, as provas comprovariam que a novidade não é a existência de um cartel de empreiteiras a atuar em todos os níveis de poder, mas o compromisso do Judiciário em punir os envolvidos em desvios de dinheiro público." 
Fonte: Carta Capital 
< http://www.cartacapital.com.br/blogs/blog-do-serapiao/a-operacao-das-operacoes-9653.html >

 No site Consultor Jurídico, Pedro Canário descreve com detalhes os motivos considerados pelos ministros para a anulação das provas, por unanimidade. Vejam:
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Fonte: Consultor Jurídico
< http://www.conjur.com.br/2014-dez-16/stf-diligencia-originou-operacao-satiagraha-foi-ilegal#author >

"O mandado de busca e apreensão falava no “endereço profissional” de Dantas. Tratava-se de sede do Grupo Opportunity, que ficava no 28º andar de um prédio empresarial na Avenida Presidente Wilson, no Rio de Janeiro. O Banco Opportunity ficava no mesmo prédio, mas no 3º andar, e durante as diligências a PF descobriu ligações entre as duas empresas.
Já dentro do prédio onde ficavam as duas empresas, o delegado da Polícia Federal Angelo Gioia pediu ao juiz substituto da 5ª Vara Federal Criminal de São Paulo, onde tramitava a chacal, Alexandre Cassetari, que autorizasse a apreensão de HDs e computadores do Banco Opportunity. Segundo o Habeas Corpus, o telefonema do agente da PF induziu o juiz a erro, pois ele não estava com os autos do processo e não sabia dos limites do mandado de busca e apreensão.
No despacho, Cassetari afirma que, no telefonema, Gioia falou sobre a importância do HD do servidor do Banco Opportunity e, por isso, ele não autorizou a apreensão, mas somente a cópia do conteúdo. “Ordeno a não apreensão do HD do servidor que se encontra nas dependências do Banco Opportunity, local em que está sendo cumprido mandado de busca e apreensão”, diz o despacho.
Para a defesa de Dantas, a frase “local em que está sendo cumprido mandado de busca e apreensão” denota que o juiz foi induzido a erro, já que o mandado estava sendo cumprido no endereço profissional de Daniel Dantas, e não no endereço da sede do banco.
Sem detalhes
A ministra Cármen Lúcia, em seu voto-vista, concordou com os argumentos da defesa. Segundo ela, a ampliação do mandado, “sem a devida pormenorização”, faz com que as buscas no segundo endereço tenham sido ilegais. Ela lembrou que a jurisprudência da própria 2ª Turma é a de que não se pode estender os efeitos de um mandado sem dar detalhes do local onde ele deve ser cumprido, “sob pena de tornar nulas as provas”. “Não há uma identificação precisa nem sobre a conversa telefônica” que motivou a nova diligência, disse a ministra.
Polarização
Em seu voto, o ministro Celso de Mello afirmou que se trata de mais um caso de “polaridade entre poder do Estado e direito do particular”. “A ação persecutória do Estado, para revestir-se de legitimidade, não pode se basear em meios ilegítimos.”
O decano citou que o artigo 243, incisos I e II, do Código de Processo Penal obriga os mandados de busca e apreensão a dizer, com a maior precisão possível, o endereço da casa onde ele será cumprido. E no caso, como já havia votado o ministro Gilmar, o escritório de Dantas se equipara à “casa” referida na lei, já que é um espaço privado sem circulação pública.(Nota 1)
“Houve intrusão de policiais no espaço privado”, disse o ministro Celso de Mello (foto). “Nenhum agente público, policial ou não, ainda que animado dos melhores propósitos, pode entrar no espaço privado sem autorização judicial.”
Da Chacal à Satiagraha
Foi das investigações da operação chacal que nasceu a Operação Satiagraha, talvez a mais famosa megaoperação já conduzida pela Polícia Federal. Ela investigou indícios de crimes financeiros cometidos por Daniel Dantas e o Opportunity durante o processo de privatização da Brasil Telecom.
Esses indícios foram descobertos justamente nessa diligência que foi ao andar que não devia. Nesses HDs e no servidor foi que a Polícia Federal teve acesso a informações de clientes do Banco Opportunity que basearam um laudo depois enviado à Justiça Federal de São Paulo. Esse laudo deu origem à Operação Satiagraha.
A operação foi derrubada pelo Superior Tribunal de Justiça porque as provas foram colhidas de maneira ilegal. Ficou provado que o delegado responsável, Protógenes Queiroz (foto), convocou agentes da Abin (Agência Brasileira de Inteligência) para ajudar nas interceptações telefônicas, usou dependências e pessoas de fora da PF, como detetives particulares além de intensa troca de telefonemas com empresários.  Hoje, corre no Supremo um inquérito que investiga se a operação foi financiada por adversários de Daniel Dantas no mercado financeiro para derrubá-lo do controle da BrT."
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Vale lembrar que a Operação Satiagraha também provocou a liberação mais dinâmica de Habeas Corpus, a favor de Daniel Dantas, emitido em tempo recorde pelo ministro Gilmar Mendes. O juiz Fausto De Sanctis - TJ/SP(Nota 2), foi quem emitiu os mandados de prisão.
Um novo escândalo de corrupção foi revelado nesse mês de mar/15 pela Polícia Federal e Ministério Público, que põe a Máfia dos Fiscais dos vereadores de São Paulo e o Mensalão no chinelo. Trata-se de desvios estimados em R$ 19 bilhões por parte de conselheiros e fiscais lotados no CARF - Conselho Administrativo de Recursos Federais, órgão criado pela Medida Provisória nº 449 em 2008, convertida em lei em 2009. A quadrilha eliminava ou reduzia multas milionárias de mondadoras de veículos, bancos e outras grandes empresas  
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Notas:
1. Considerando que o Banco Opportunity no 3º andar, onde foram encontrados e copiados os HDs, é de Daniel Dantas, e pode ser considerado também como sua casa. É um espaço privado e sem circulação pública, como é de se supor estar localizados o servidor do banco Opportunity, donde foram copiados os HDs, conforme decisão do juiz.
2. Conheça o preparo e o prestígio do juiz De Sanctis, no site Consultor Jurídico:
< http://www.conjur.com.br/2014-dez-14/entrevista-fausto-sanctis-desembargador-trf-regiao >

# Este comentário foi veiculado de forma resumida na coluna Espaço do Leitor do jornal A TARDE de 27.03.2015

* Texto revisado e atualizado em 27.03.2015.

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