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quinta-feira, 3 de novembro de 2016

O pi do quadrado - Lendas & Lembranças

Nas vésperas do vestibular da Universidade Federal do Pará, de 1965, o professor de geometria do cursinho que eu frequentava, Hélio Dourado, proporcionou uma aula de relaxamento mental. 

Levou-nos até uma nova sala, no segundo piso da ala direita do Colégio N. Srª. de Nazaré, e apresentou uma questão até então inusitada para nós: Qual é o pi do quadrado?


Arte com o a constante pi

A pergunta, como previra o professor, deixou-nos surpresos e curiosos. 

E a partir daí, o professor foi desenhando no quadro os vários elementos, como se preparasse um altar para celebrar a abertura de novos horizontes em nossas mentes que, naquele momento, estavam entulhadas de fórmulas, cálculos e outros conhecimentos, acumulados na história da humanidade. 

Aquela aula ensinou-me a procurar com a mente livre de memórias limitadoras, as informações que melhor revelam a realidade.

Como já aprendemos, a constante pi é o resultado prático obtido pela divisão da medida da circunferência pelo diâmetro do círculo... 

                                              pi = C / D 

Qualquer que seja o diâmetro o resultado é o mesmo: 3,14159... Número que, mesmo com os recursos de computação, não se alcançou o dígito final.  Na prática, usa-se o valor:  pi = 3,1416

Voltando à pergunta inicial: Qual é o "pi" do quadrado?

Lembramos que qualquer polígono regular - com qualquer número de lados - pode ser inscrito em um círculo.


Figura 1

A figura 1 mostra o detalhe de um polígono regular com mais de 20 lados. 
Na base está um lado (L) do polígono, os lados iguais do triângulo (R) e sua altura (h) ou apótema (a).
Percebe-se que quanto maior o número de lados do polígono o tamanho do lado (L) vai ficando cada vez menor... Até seu lado se confundir com um ponto da circunferência e a altura com o raio do círculo.

Podemos deduzir que a circunferência é um polígono regular com o número de lados que tende ao infinito. Nele, a altura ou apótema se iguala ao raio do círculo... E a área do círculo será igual à soma desses infinitos triângulos isósceles magrinhos.
Com essa visão achamos a fórmula da área do círculo (Ac). 
Basta somar a área de cada triângulo magrinho (At) que é: 
                                    At = lado x altura / 2 
Como no caso do polígono de infinitos lados a altura se confunde com o raio, teremos:  
                                    At = L x R / 2  (I)

Agora, basta somar as áreas dos infinitos triângulos magrinhos.

A área do círculo será:  Ac = At1 + At2 + At3 + At4 ...........

Substituindo a área de todos os infinitos triângulos magrinhos pela expressão (I), temos:   
                                Ac = LR/2 +LR/2 +LR/2 +LR/2 +LR/2 ....

Pondo R/2 em evidência:  Ac = R/2 ( L + L + L L + ....)  (II)

Sabendo que no caso de um polígono com infinitos lados a soma de dos lados é igual à medida da circunferência C, substituindo na expressão (II), fica:   Ac = R/2 x C

Sendo C = 2piR  teremos:  Ac = R/2 x 2pi

Simplificando, temos que a área de um círculo é :  Ac = pi.R² 


Achei muito legal essa interpretação da circunferência ser um polígono regular que tem um número infinito de lados! 
Aliás, sou fascinado pelo conceito de infinito, e mais ainda de termos capacidade de pensar e utilizar o conceito.

Mas seria bom se tivéssemos uma constante para cada polígono regular. 
Não seria necessário fazer cálculos para achar o diâmetro do círculo onde preciso inserir um octógono com 1,35 metros de lado?
Mas como sobrevivemos até hoje sem essas constantes, encontrá-las fica como curiosidade, divertimento, desafio...

Agora, para os que chegaram até aqui, tentarei passar os dados daquela aula, desenvolvida em conversa reveladora, entrou pela noite sem que eu sentisse qualquer cansaço.

Voltando à pergunta inicial: Qual é o "pi" do quadrado?

Lembramos que qualquer polígono regular - com qualquer número de lados - pode ser inscrito em uma circunferência.



Figura 2

Na Figura 2, vemos o desenho de um quadrado inscrito em um círculo, onde estão identificados seus principais elementos: lado do quadrado, raio do círculo e a apótema.

Se na circunferência a constante pi é obtida com a divisão do cumprimento da circunferência pelo diâmetro (pi=C/D ), a do quadrado - que podemos chamar de q - será o cumprimento de seu perímetro 4xL, dividido pelo diâmetro do círculo  ou   q = 4L/D   (III)                                               
No triângulo retângulo acima temos:  D² = L² + L² ou D² = 2L² 

Extraindo a raiz em ambos os lados da igualdade, temos:
                   
D = L x V 2    donde L = D    (diâmetro sobre raiz de 2)
                                   V2
Substituindo L na expressão (III) acima, teremos;  
                                                          
                      q = 4 (D/ V 2 )  ou 4D   (quatro D sobre D raiz de 2) 
                                 D               DV2
                                       
simplificando:  q = 4 / V 2   = 4 / 1,4142... = 2,8284542497... 

                      Eureka!!!  que em grego quer dizer: ACHEI!

A constante q do quadrado inscrito em um círculo é: 2,8284

Conhecendo-se o raio do círculo, calculamos a medida do perímetro de um quadrado:  Q = 2qR ou Q=2.2,8284 x R ou Q = D x 2,8284

Como todos já devem ter percebido, cada polígono regular inscrito em um círculo tem sua constante (?), que é igual ao perímetro (P) dividido pelo seu diâmetro (D). 

                         Constante (?) = P / D

Que tal escolher um polígono e achar sua constante? 

A constante do hexágono é muito fácil...


* Revisei e corrigi o objetivo desse post em 14.04.21.



........................

Essas lembranças vieram-me ao imaginar a tensão que os participantes do ENEM estão sofrendo, com as incertezas pelo adiamento das provas daqueles que a fariam em escolas ocupadas por protestos E agora, com a entrada ontem (02.11.2019) na Justiça, de uma ação feita pelo procurador Oscar Costa Filho, do MPF do Ceará, pedindo adiamento geral das provas.

O pedido foi negado hoje, pela juíza Elise Avesque Frota, que rebateu o argumento utilizado pelo procurador da República no Ceará - de que não haveria isonomia no caso de duas provas com temas de redação diferentes - afirmando em sentença que "apesar da diversidade de temas que inafastavelmente ocorrerá com a aplicação de provas de redação distintas, verifica-se que a garantia da isonomia decorre dos critérios de correção previamente estabelecidos".

E conclui sua argumentação da isonomia na redação, mesmo com temas diversos: "Há ênfase na avaliação do domínio da língua e de outras competências que não têm 'o tema' como ponto central".

Dos males, o menor!

Tensão bem maior sofremos nós, quando no vestibular de 1964, o professor de Física, Curtis Siqueira - que havia elaborado a prova aplicada naquele ano - considerou, totalmente errada, a resposta do cálculo da distância entre a imagem e o espelho côncavo, caso o vestibulando tivesse dado apenas a resposta para a imagem real, e não tivesse considerado a distância negativa da imagem virtual, ambas resultantes de uma raiz quadrada, que têm sempre duas respostas iguais de sinais trocados.
Nesse caso, muitos seriam reprovados no vestibular...

Após dois dias de idas e vindas, Curtis aceitou considerar os pontos da questão, mesmo no caso de ter sido dada apenas como resposta a distância positiva da imagem real. Ufa!

Foi nesse episódio que recebi de meu pai o maior de todos os elogios.

Os amigos da mesa de baralho, que também tinham filhos no vestibular, se aborreceram com a calma dele e reclamaram: 

- Pô, Renato, todo mundo preocupado com a possibilidade de reprovação dos meninos e você ai nessa tranquilidade! 

Meu pai, respondeu: 

- Meu garoto é competente.

Ele mesmo me contou às gargalhadas o sarro que tinha tirado da cara dos amigos.

A sorte foi que deu tudo certo, graças a Deus!

...

Texto do álbum: Lendas & Lembranças

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