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quarta-feira, 21 de setembro de 2016

O elemento água

                             

Domingos Montangner

Ainda não consegui entender o que fez Domingos desistir de nadar, boiar, lutar para se manter vivo. Camila também não entende porque ele não movimentava os braços para nadar e se manter na superfície, mesmo depois de ir até ele, segurá-lo, puxando, "Venha, aqui nessa pedra onde estou está tranquilo!", mostrando que nas pedras onde ela se refugiou, não havia correnteza forte nem redemoinhos. Ele se movimentava como que estivesse extenuado. Submergiu por duas vezes engolindo água e pareceu desistir quando, por várias vezes, responde a ela: "Eu não consigo, eu não consigo!"... Até afundar e desaparecer de vez nas águas turbulentas.

...

Nazá,João,Zé,Madô,Carlos,Paulo,Graca

Lembro-me de quando com uns oito anos passava férias na praia da Coroa Comprida, na foz do Rio Caeté, próxima à cidade de Bragança, no Pará. A família toda - mãe, avó e nove filhos - entrava na praia com naturalidade . Não lembro de maiores cuidados ou preocupações com a turminha, a não ser com o de colo da época. Numa manhã, brincando, nadando e mergulhando na praia tranquila, meus pés não alcançaram mais a areia do fundo, submergi ao cair em um "peral" - depressão na areia do fundo da praia, provocada pelo movimento das ondas. A água era limpa e permitia boa visibilidade. Submerso, com tranquilidade, comecei a andar no fundo em direção à parte mais rasa, quando Madô, minha irmã mais velha três anos, me levantou pelos cabelos à superfície da água, dizendo meio preocupada: "Tá se afogando, Zé?" Respondi que não, que caíra num buraco e estava "caminhando" para a parte rasa. 

Zé, Radar, Carlos, Gracinha

Pareceu-me que Madô achou que tive vergonha de dizer que estava me afogando. Estava sim em dificuldade, mas não bebi água, nem cheguei a um estado de alerta. É que um leve movimento das águas para a parte funda, dificultava minha "caminhada" de subida. 

De qualquer modo, agradeço a Deus por Madô ter-me tirado da dificuldade, que poderia se complicar de verdade. 

Bem que eu já sabia nadar e, se fosse preciso, iria à superfície, tentaria nadar para a parte rasa ou gritaria por socorro! 

Aliás, coisa boa é nadar sem nunca ter aprendido, né não?

Carlos, Paulo e Zé

Mas foi por saber nadar que, noutra ocasião, em um pequeno açude que íamos sempre no Rio da Serra em Bragança, tive uma péssima experiência, para aprender e nunca mais esquecer. 

Estávamos - numa turminha miúda com seus nove anos incompletos - conversando na beira do açude depois dos mergulhos. Um dos garotos se gabava que nadava muito bem, mergulhava, atravessava, fazia isso, fazia aquilo... "Sabe nada, disse eu, pula aí e mostra, seu mentiroso!" E empurrei o moleque, que se desequilibrou, caiu nágua e começou a gritar e se debater. 

O filho da mãe não conseguia nadar nem "estilo prego": aquele que vai ao fundo, impulsiona com os pés para cima até alcançar a superfície, respira, afunda, impulsiona de novo... 

Quando vi que ele estava se afogando pulei nágua para ajudar. Ele se agarrou em volta do meu pescoço e me afundava. Enquanto ele respirava, eu ficava submerso. Tentei me soltar, mas o "abraço de afogado" é puro desespero, eu não conseguia respirar. 

Depois de tentar me desvencilhar por longos quinze segundos, sem conseguir, foi que vi a coisa - nem preta nem branca - bem clara: "Estou me afogando." E para me livrar do sufoco, deixei de empurrar com os pés no fundo e me deixei afundar... 

O garoto me largou para respirar na superfície e, finalmente, pude encher os pulmões de ar. Subi na beirada do açude e, junto com os outros dez moleques que gritavam pedindo socorro, fiquei vendo angustiado o garoto se debater na água. Foi quando vi por entre as lágrimas, um rapaz com seus dezesseis anos, atlético, magro, voando em disparada lá das beiradas do caminho do Preto Pretinho, pulou nágua, levantou o menino já bem cansado e o colocou sentado na borda do açude... 

Um alívio! Uma bênção! Mais um motivo de muita gratidão a Deus.   E como bem percebeu Camila: uma nova chance. 


Domingo e Camila, par romântico
da novela "Velho Chico"


Texto do álbum Lendas & Lembranças 

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