Existirá um
conhecimento específico para ser feliz? Como obter e desfrutar da felicidade? De
algum modo, essa proposta de um amigo no grupo Acrópoles nos fez calar e, o
melhor, nos fez pensar. Viveremos o dia em que será incluída no currículo
educacional básico a disciplina: noções de felicidade?
Lembro então
o diálogo entreouvido por Nietzsche: “Seria loucura, talvez, pretender algo
assim. Mas tudo que é grande talvez tenha sido loucura no início!”.
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Sem qualquer dúvida, a humanidade nunca
esteve tão bem estruturada em tecnologia, poder e ciência. Desde cedo
aprendemos a ler, escrever, contar e um mundo de outras coisas que os atuais
meios de comunicação instantânea permitem. O volume de conhecimento, de tão
vasto, impõe especializações no ensino dos artífices e profissionais. O
conhecimento geral de Linguagem, Gramática, Aritmética, Matemática, Física,
Química, Biologia, História e Geografia, já não é suficiente para tornar uma
pessoa apta a desenvolver uma atividade. As disciplinas para o aprendizado
fundamental do discípulo-cidadão na Grécia Antiga – Linguagens (prosa,
oratória, dialética, poesia, teatro...), Matemática, Ginástica, Jogos, Música e
Ciências Naturais - se expandiu e muitas outras matérias ainda são
incluídas, até nos dias de hoje, no currículo das escolas, colégios e
faculdades. Surge então, de repente, a pergunta quase
esquecida: Para que servem as ciências?
"Ora!" - dirá o poeta distraído a
contar estrelas - "Elas servem para o ser humano construir sua
felicidade!"
Pelo visto, pode-se concluir que ser
feliz é apenas um detalhe, sem aparentemente muita importância. A ênfase
educacional é dada às disciplinas e às ciências que ensinam nossos filhos a ser
um elemento produtivo, um agente da produção, enlevado pela promessa de
tornar-se uma pessoa de sucesso... Em resumo: rico.
No fim do ano de 2002, foi aprovada pela
Comissão de Educação do Senado a inclusão da disciplina noções de cidadania
no currículo escolar (1). No início deste ano, foi tornado obrigatório o ensino
da história da África e da cultura afro-brasileira nos estabelecimentos
de ensino fundamental e médio, oficiais e particulares. (2)
Um amigo, afeito a questões que passam
despercebidas ou preferimos esquecer, acredita que ainda está faltando uma
importante matéria no ensino fundamental, e propôs que seja incluída no
currículo educacional uma disciplina que ensine às nossas crianças e jovens a
ciência da felicidade.
Existirá um
conhecimento específico para ser feliz? Como obter e manter a felicidade? De
algum modo, a proposta dele nos fez calar e, o melhor, nos fez pensar.
Viveremos o dia em que será incluída no currículo educacional básico a
disciplina: noções de felicidade? Ruborizamos ao parecer ridículos.
Lembro aqui o diálogo entreouvido por Nietzsche: “Seria loucura talvez,
pretender algo assim? Mas tudo que é grande talvez tenha sido loucura no
início!”(3)
Creio que a Ciência da Felicidade vem
sendo pesquisada e desenvolvida há muito tempo, mas, como requer um mínimo de
visão, sabedoria e lucidez, continuamos como os nossos ‘primos’ macacos a tentar
obtê-la sem abrir a mão. E, assim, ficamos prisioneiros com a mão enfiada na
cumbuca da existência, de onde tentamos tirar a própria felicidade... A
qualquer custo.
O desafio de definir conhecimentos e regras
para viver feliz lembra, de certo modo, o enigma da Esfinge: decifra-me ou
permanecerás infeliz. Será que poderíamos todos ser instruídos na sabedoria
edipiana rumo às Tebas modernas? Diversas
filosofias, códigos e religiões continuam tentando implantar costumes numa
comunidade onde todos vivam a arte de ser feliz. Geralmente falham, quando
seus seguidores percebem, que as regras básicas ditadas não são seguidas nem
por seus próprios arautos.
Talvez a forma de alcançar a felicidade seja
o maior obstáculo, visto ser ela "perseguida" pelos viventes.
Qualquer um ao ser perseguido sente-se acuado e foge. Geralmente, queremos
retê-la para sempre em nós, em vez de simplesmente desfrutá-la. É como
tentar pegar no ar bolhas coloridas de sabão ou aprisionar o canto dos pássaros
em gaiolas. A felicidade, nesses casos, não se realiza. Ficamos frustrados
sem saber por quê.
Outros valores são importantes nessa
busca e requerem preparação. Eles são estruturados no seio da família, onde a
criança obtém suas primeiras referências. É o principal fundamento.
O resto é, em grande parte, conseqüência desse primeiro aprendizado.
Em pesquisa da Unicef, em 2002, os jovens elegeram a família o ponto de apoio
fundamental na educação e na formação dos seus valores pessoais e sociais. Isso
me parece significativo, pois há em contrapartida, uma enxurrada difícil de ser
contida, por parte das mídias, onde a felicidade é oferecida ao jovem
consumidor sob vários e sedutores artifícios, antes mesmo dele aprender a falar
e desenvolver um melhor entendimento.
Felicidade é o orgasmo transmitido
sob gemidos e mãos crispadas nos lençóis na telinha do faz-de-conta... É
sair do shopping carregando sacolas de grifes famosas. Não é só usar uma roupa
bonita e elegante em que me sinto confortável! Ela se realiza no ato de
comprar, mostrar aos outros o meu poder de compra e não no usufruto do bem adquirido.
Felicidade é tirar vantagem em tudo, certo? É procurar parecer que é, em vez de
ser... Parece-me que a felicidade, hoje, é aquela
que os marqueteiros dizem ser, durante as 25 horas do dia.
Na prática, observo nas pessoas que parecem
viver a felicidade, uma agradável mistura de paz, confiança, tranqüilidade,
disposição, integridade, percepção e atenção à realidade... E,
curiosamente, todas elas parecem dispor de todo o tempo do mundo! O que será
que elas fazem para alcançar aquilo que imagino que só bastante dinheiro pode
me dar?
As crianças - quando se sentem
em ambiente seguro - transmitem essas "qualidades" ao serem
simplesmente felizes. Suas preocupação e realizações são imediatas, logo
desfrutadas. Um pouco diferente da elaborada felicidade, programada por nós,
hoje, menos crianças. Serei feliz quando: colar grau, me empregar,
comprar um apartamento, um carro, ter aumento de salário, casar, separar,
ter um filho, os filhos crescerem, tornarem-se independentes, me
aposentar, ganhar a megassena acumulada (sozinho, claro) e outras pendências,
que me imponho a cada época da vida.
Seria importante, inicialmente, definir
quando estamos felizes, ou melhor, quando nos percebemos e nos consideramos
felizes. E, finalmente, tentar definir essa tal felicidade, geralmente só
percebida depois que não a temos mais, resumida na frase: "éramos felizes
e não sabíamos".
Cada um apresentará sinais e valores
próprios de um estado de felicidade. Muitas coincidências ocorrerão. Uma, que
certamente estará em todas elas, já foi dita por Tom Jobim em Wave, de forma tão
banal que às vezes é confundida com filosofia barata: "é impossível
ser feliz sozinho". No verso anterior Tom considera que "fundamental
é mesmo o amor"... E o que é o amor?
É... Precisamos aprender também
sobre essas coisas atualmente esquecidas por algum motivo que
talvez Freud explique às mulheres, pois deixou sem resposta a questão: “O
que querem as mulheres?”.
A inclusão nos currículos educacionais, de
matérias que ensinem a ciência da felicidade, não terá maiores
resultados em nossa formação. Quem sabe na dos nossos filhos, na dos filhos dos
nossos filhos...
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Notas:
- A TARDE de 03.12.2002, sob o título:
Mudança na Lei de Diretrizes e Bases da Educação-LDB.
- Lei
n° 10.639, sancionada pelo presidente da República no dia 09.01.2003,
altera a Lei n°. 9.394, de 20.12.1996, que estabelece as diretrizes e
bases da educação nacional, que passa a vigorar acrescida dos artigos n°s.
26-A e 79-B.
- Nietzsche,
Friedrich - Além do Bem e do Mal – Prelúdio a uma Filosofia do Futuro,
capítulo oitavo: Povos e Pátrias, n° 241 pág.149 – Cia. das Letras.
Autor: José
Renato M. de Almeida, pesquisador da evolução dos conhecimentos sócio-culturais versus tecnológicos na história da humanidade. Salvador – Bahia E-mail: < jrmalmeid@gmail.com.br
>
Veiculado no grupo de discussão Acrópolis:
< http://br.groups.yahoo.com/group/acropolis/files/Membros/ >
Veiculado no grupo de discussão Acrópolis:
< http://br.groups.yahoo.com/group/acropolis/files/Membros/ >
* As idéias não têm dono... Mas têm autoria.
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